2016-10-29 11:41:00

Papa: não se pode ser católicos e sectários


O Papa Francisco concedeu uma entrevista sobre sua viagem apostólica à Suécia, que se realizará de 31 deste mês a 1° de novembro, ao sacerdote jesuíta Pe. Ulf Jonsson, diretor da revista jesuíta sueca “Signum”, junto com o diretor da revista jesuíta italiana “La Civiltà Cattolica”, Pe. Antonio Spadaro.

"Não se pode ser católico e sectários" disse o Pontífice na entrevista concedida na véspera da visita à Suécia para a comemoração ecumênica dos 500 anos da Reforma Luterana.

“Na entrevista o Papa falou, entre vários assuntos, sobre sua amizade com os luteranos desde quando era garoto e depois nos tempos de seu ministério episcopal. Além de explicar as modalidades da visita e seu significado, Francisco falou sobre o desafio espiritual para as Igrejas “envelhecidas” e sobre a importância da inquietude na sociedade marcada pelo bem-estar. A propósito do diálogo ecumênico sublinhou a importância de “caminhar juntos” para não permanecer fechados em perspectivas rígidas, porque nelas não há possibilidade de reforma.

Introdução do Pe. Jonsson

“Durante um encontro dos diretores das revistas culturais europeias da Companhia de Jesus, na metade de junho, manifestei ao Pe. Antonio Spadaro, diretor de La Civiltà Cattolica, um desejo que eu tinha no coração há muito tempo: entrevistar o Papa Francisco na véspera de sua viagem apostólica à Suécia, 31 de outubro de 2016, para participar da comemoração ecumênica dos 500 anos da Reforma Luterana. Pensei que uma entrevista fosse a melhor maneira de preparar o país para a mensagem que o Pontífice teria endereçado às pessoas durante sua visita. Como diretor da revista cultural dos jesuítas suecos Signum, pensei que este objetivo entrasse plenamente em nossa missão.

O ecumenismo, assim como o diálogo entre as religiões e também com os não fiéis, está muito no coração do Papa. Ele fez entender isso de muitas maneiras. Ele é um homem de reconciliação. Francisco está profundamente convencido de que os homens devem superar barreiras e cercas de qualquer tipo. Acredita no que define “cultura do encontro”. Isso para que todos possam colaborar para o bem comum da humanidade. Queria que esta visão de Francisco pudesse tocar a mente e o coração de muitos antes de sua chegada à Suécia: a entrevista teria sido o meio melhor para alcançar tal objetivo. Disse isso ao Pe. Spadaro com o qual prossegui a reflexão até agosto, quando juntos chegamos à conclusão de que era realmente oportuno apresentar ao Pontífice este pedido a fim de que pudesse decidir se realizá-la ou não. O Papa tomou tempo pra refletir sua oportunidade. No final, a resposta foi positiva e nos deum um encontro na Santa Marta na tarde do sábado, 24 de setembro passado.

Foi um dia realmente agradável por causa da temperatura e luminosidade do céu. Atravessando o trânsito de Roma de carro com Pe. Spadaro, estava ansioso, mas feliz. Chegamos a Santa Marta 15 minutos antes do previsto. Pensei que devíamos esperar e ao invés fomos logo convidados a subir ao andar onde o Papa tem o seus aposentos. Quando o elevador se abriu, vi um guarda-suíço que nos saudou com cortesia. Ouvi a voz do Papa falar cordialmente com outras pessoas em espanhol, mas não o vi. A um certo ponto ele apareceu com duas pessoas, conversando amigavelmente. Nos saudou com um sorriso indicando-nos de entrar em seus aposentos: ele voltaria logo.

Fiquei surpreso com esta simples e calorosa familiaridade o acolhimento. Foi-nos dito na portaria que o Papa teve um dia intenso, e eu pensei que estivesse cansado no final do dia. Ao invés disso, fiquei surpreso em vê-lo tão cheio de energia e relaxado.

O Papa entrou na sala e nos convidou a sentar onde preferíamos. Sentei-me numa poltrona e Pe. Spadaro diante de mim. O Papa se sentou no sofá no meio das duas poltronas. Apresentei-me no meu italiano pobre, mas suficiente para entender e dialogar com simplicidade. Depois de algumas brincadeiras do Papa acendemos os gravadores e iniciamos a conversa.

Pe. Spadaro traduziu do inglês algumas perguntas que eu queria fazer ao Papa e que eu tinha preparado, mas depois da conversa entre nós três fluiu naturalmente, numa atmosfera amigável e sem distâncias artificiais. Sobretudo porque foi claro e direto, sem rodeios e sem que a atmosfera típica dos encontros com os grandes líderes ou pessoas a respeito. Não tenho nenhuma dúvida de que o Papa Francisco ama conversar, comunicar com os outros. Às vezes toma tempo para refletir antes de responder, e suas respostas sempre transmitem uma sensação de envolvimento sério, mas não pesada ou triste. Na verdade, durante a nossa visita, ele deu várias vezes sinais de seu humorismo.

Entrevista

Santo Padre, em 31 de outubro o senhor visitará Lund e Malmö para participar da Comemoração Ecumênica dos 500 anos da Reforma, organizada pela Federação Luterana Mundial e pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos. Quais são as suas esperanças e suas expectativas para este evento histórico?

“Digo somente uma palavra: aproximar-se. A minha esperança e expectativa são as de me aproximar mais de meus irmãos e irmãs. A proximidade faz bem a todos. A distância ao invés nos faz adoecer. Quando nos distanciamos, nos fechamos dentro de nós mesmos e nos tornamos nômades, incapazes de nos encontrar. Nos deixamos levar pelo medo. É preciso aprender a se transcender para encontrar os outros. Se não o fazemos nós cristãos nos adoecemos de divisão. A minha expectativa é a de conseguir fazer um passo de proximidade, de estar próximo aos meus irmãos e irmãs que vivem na Suécia.”

A sua visita à Suécia tocará um dos países mais secularizados no mundo. Boa parte de sua população não acredita em Deus, e a religião tem um papel um pouco modesto na vida pública e na sociedade. Segundo o Senhor, o que perde uma pessoa que não acredita em Deus?

“Não se trata de perder alguma coisa. Trata-se de não desenvolver  adequadamente uma capacidade de transcendência. O caminho da transcendência dá lugar a Deus, e nisto são importantes também os pequenos passos, até mesmo o do ateu a ser agnóstico. O problema para mim é quando se fecha e se considera a própria vida perfeita em si mesma, portanto, fechada em si mesma, sem necessidade de uma transcendência radical. Mas para abrir aos outros a transcendência não é necessário fazer muitos discursos e palavras. Quem vive a transcendência é visível: é um testemunho vivo. No almoço que tive em Cracóvia com alguns jovens, um deles me perguntou: “O que deve dizer a um mio amigo que não acredita em Deus? Como faço para convertê-lo? Eu lhe respondi: “A última coisa que deve fazer é dizer alguma coisa. Aja! Vivi! Depois, vendo a sua vida, o seu testemunho, talvez o outro irá perguntar porque você vive assim. Estou convencido de que quem não crer ou não procura Deus talvez não sentiu a inquietude de um testemunho. Isso está muito ligado ao bem-estar. A inquietude se encontra dificilmente no bem-estar. Por isso, acredito que contra o ateísmo, ou seja, contra o fechamento à transcendência, valem realmente, somente a oração e o testemunho.”

Os católicos na Suécia são uma pequena minoria, e na maior parte composta por imigrantes de várias nações do mundo. O senhor se encontrará com alguns deles celebrando a Missa em Malmö em 1° de Novembro. Como vê o papel dos católicos numa cultura como a sueca?

“Vejo uma convivência saudável, onde cada um pode viver sua fé e expressar o seu testemunho, vivendo num espírito aberto e ecumênico. Não se pode ser católicos e sectários. Devemos nos esforçar para estar com os outros. "Católico" e "sectário" são duas palavras que se contradizem. É por isso que no início eu não previa celebrar uma missa para os católicos nesta viagem: Eu queria insistir num testemunho ecumênico. Depois eu refleti bem sobre o meu papel de pastor de um rebanho católico que chegará também dos países vizinhos, como a Noruega e a Dinamarca. Então, respondendo ao pedido fervoroso da comunidade católica, decidi celebrar uma missa, aumentando a viagem de um dia. Na verdade eu queria que a missa não fosse celebrada no mesmo dia e não no mesmo lugar do encontro ecumênico para evitar confundir os planos. O encontro ecumênico deve ser preservado em seu profundo significado, segundo um espírito de unidade, que é o meu. Isto criou problemas de organização, eu sei, porque eu vou estarei na Suécia também no Dia de Todos os Santos, que aqui em Roma é importante. Mas, a fim de evitar mal-entendidos, eu quis que fosse assim.”

(MJ)








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