2016-06-09 10:12:00

Francisco, a comunicabilidade dos gestos


Neste “Sal da Terra, Luz do Mundo” o padre Pacheco Gonçalves, autor desta rubrica e por muitos anos nosso colega da redação de língua portuguesa da RV, analisa o pontificado de Francisco.

O padre José Maria Pacheco Gonçalves foi testemunha de algumas das primeiras atitudes do Papa Francisco logo no dia a seguir à sua eleição, em particular, o pagamento das despesas de alojamento do Cardeal Bergoglio na Domus Paulus onde residia o próprio padre Pacheco.

O nosso ex-colega de redação depois de ter vivido tantos acontecimentos e celebrações nos pontificados de João Paulo II e de Bento XVI arriscou nesta entrevista uma análise do pontificado de Francisco, sublinhando, em primeiro lugar, o “ambiente de desconcerto” que havia na Curia Romana antes do conclave de março de 2013 devido a vários escândalos.

Para tudo isto, surgiu Francisco, quase como um “milagre” – salienta o padre Pacheco Gonçalves – um novo Papa com uma atitude de fé e de esperança, com o seu “sorriso” e a sua “calma”, num rosto transfigurado, cheio de “alegria” e de “bom humor”, desenvolvendo uma “comunicabilidade que lhe vem dos gestos” sendo “genuíno, sincero, autêntico” e uma “surpresa contínua”.

Publicamos aqui o essencial das declarações do padre José Maria Pacheco Gonçalves:

“É uma surpresa contínua … e eu penso que é sempre difícil fazer um balanço … ainda estamos a caminho e ainda há surpresas que nos esperam! Mas, a primeira coisa que me vem espontaneamente é de dizer que temos que dar muitas graças a Deus. Aliás, se pensamos nos Papas do século XX, e mesmo os Papas anteriores ao Papa Francisco, podemos dizer já isso. Mas, o que é impressionante é que, e nós vivemos isso muito de perto trabalhando ali em Roma na rádio… é que a situação que se vivia na Igreja, não só na Curia Romana, não só em Roma, mas na Igreja Católica, nos anos e, sobretudo, nos meses que precederam a eleição do Papa Francisco… e que precederam a decisão do Papa Bento XVI de resignar… era, de facto, um ambiente, não digo de desespero mas de grande desconcerto, de uma espécie de desânimo, de desorientação. Mesmo nas reuniões que os cardeais fizeram antes do conclave era isso que imperava. Era um certo medo em relação ao futuro como se houvesse um descalabro, como se fosse uma situação quase trágica.”

“E o Papa Francisco apareceu como uma espécie de milagre, com aquele sorriso, com aquela calma. E eu tive ocasião de o ver logo no dia seguinte à sua eleição e ele apareceu com o rosto transfigurado de bonomia, de bom humor, de alegria que foi por si logo à partida toda uma mensagem. Eu penso que isso foi a coisa mais impressionante e é, se calhar, já um dos aspetos fundamentais deste pontificado, que é uma carga de fé e de esperança, de não ficar simplesmente esmagado pelas situações que são, de facto, preocupantes a todos os níveis no mundo e também na Igreja tantas vezes, mas viver positivamente todas e quaisquer circunstâncias. E, no que diz respeito, a esse caso concreto de escândalos que tinham surgido um bocado ligados à Curia Romana e que depois eram muito difundidos e até… em italiano diz-se “gonfiati”, ficavam inchados, ficavam desmesuradamente grandes através dos meios de comunicação, é como se tivesse havido um balão que o Papa com um alfinete esvaziou tudo isso.”

“´É engraçado que ele sendo chamado pelos cardeais a enfrentar a crise da Curia Romana e a renovar a Curia Romana, o Papa não fez disso o primeiro objetivo do pontificado, pelo menos na ordem prática das coisas, porque senão enredava-se em mais comissões para fazer análises, para estudar a resolução e mantinha os olhos concentrados sobre isso. O simples facto, por exemplo, de ter dado início à Missa quotidiana com as homilias, aparentemente muito simples mas em que deixa, efetivamente, uma mensagem e um rumo para a Igreja e para todos os cristãos, deslocou o centro das atenções. Mas não foi só uma estratégia, não foi só uma maneira de ‘driblar o adversário’ para ver se isto dá resultado. Não! É porque ele está centrado no exercício da atividade pastoral.”

“Faltava esta figura, que é toda dinamismo, toda capacidade criativa e, sobretudo, uma comunicabilidade que lhe vem dos gestos e dos gestos sinceros. Ao princípio parecia que havia, mesmo dentro da Igreja e, se calhar, ainda há um bocado, quem suspeitasse que tudo isto fosse assim pensado para ‘dar a impressão de’… Mas, o facto de ser genuíno, de ser sincero, de ser autêntico nessas decisões e de tentar, simplesmente, viver ao nível de Papa aquilo que vivia como pastor, como arcebispo de Buenos Aires, nomeadamente, a dedicação aos mais esquecidos, aos descartados como o Papa diz, ou às periferias, ou àqueles a quem ninguém liga, isto é qualquer coisa que, espero, está a marcar, desde já, a vida da Igreja a todos os níveis. E, sobretudo, antes de mais para os bispos, padres, para os pastores da Igreja é todo um programa. E expresso não teoricamente em discursos… também quando é preciso as coisas são ditas… mas, sobretudo, antes de mais, com o exemplo.”

“Mesmo as fotografias que aparecem, às vezes, e os vídeos ajudam. Mas, o facto de saber que, de repente, ele foi visitar aquela comunidade e abraçou as pessoas e deixou-se abraçar e deixou-se fotografar, lá com aqueles ‘selfies’ todos, e aquele sorriso irradiante, é como se fosse uma presença de Cristo Pastor. E esta ideia do Jubileu da Misericórdia está ligada a isso mesmo e tem que ver, não só com o acolhimento da graça de Deus e do perdão de Deus, que é um ponto fixo que o Papa desde o princípio tem sublinhado, mas numa chamada a sermos nós próprios misericordiosos, coração aberto, braços abertos como o próprio Papa tem vivido.”

Era o padre José Maria Pacheco Gonçalves analisando o pontificado do Papa Francisco. O padre Pacheco Gonçalves foi nosso colega de redação durante muitos anos e está agora ao serviço da sua diocese do Porto em Portugal.

 

(RS)








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