2015-05-21 15:45:00

No Sudão do Sul "situação feroz": testemunho missionário


São dramáticos os testemunhos recolhidos pela UNICEF no Sudão do Sul: em duas semanas, dezenas de crianças mortas, violadas ou raptadas e recrutadas. Isto acontece na série de ataques no Estado de Unity do Sudão do Sul, teatro de confrontos sangrentos entre as forças do governo e os rebeldes ligados ao ex-vice-presidente Riek Machar. Tanto assim é que a Cruz Vermelha, ONGs e missionários tiveram de abandonar o território. Eugenio Murrali entrevistou um missionário que trabalha há anos no país, ao qual, por razões de segurança, se garante o anonimato.

Desde a Páscoa a situação deteriorou-se. O governo tenta fazer de tudo para conquistar o Estado de Unity, porque lá existem poços de petróleo: por isso, é de vital importância.
 

Qual é a situação que se vive no momento?

A situação é terrível, porque, enquanto o governo avança, queima todas as casas e as pessoas são forçadas a abandonar os seus lugares. Agora estamos no início da estação das chuvas e também no início da época das sementeiras. O problema mais grave será, portanto, a fome e a falta de protecção. Os preços tornaram-se tão altos que para as pessoas é impossível comprar: somente poucos têm acesso aos bancos e têm moeda forte, todos os outros não podem fazê-lo,  portanto vivem uma situação desastrosa. E depois, nos mercados, dificilmente se encontram as coisas que normalmente se encontram  em Juba, embora a preços elevados  e, portanto, vivem apenas daquilo que as organizações humanitárias podem trazer. Até agora, também  o PAM (Programa Alimentar Mundial) e a Cruz Vermelha têm ajudado com a comida; agora, se as pessoas têm de fugir para os pântanos ou florestas, fica  praticamente sem nada. Este é o primeiro ponto: muitos morrerão de fome, sobretudo as crianças, que já estão desnutridas. O segundo aspecto é o abuso das mulheres, a violência contra as mulheres: as primeiras que pagam são as mulheres e meninas. No passado, chegaram de estuprar até mesmo meninas de 12 anos ou mesmo mulheres de 60 e mais anos. É uma situação verdadeiramente feroz.

O que vos levou a decidir de ir embora?

Ouvimos dizer que a primeira linha já não conseguia mais resistir e que já tinham chegado até Koch. As notícias diziam que haviam já queimado várias aldeias, tinham morto jovens e levado consigo meninas. Assim, também de acordo com outras ONGs, nós pensamos que essa era a única coisa que se podia fazer.

Este é um confronto étnico entre os Dinka e os Nuer, ou um conflito ligado mais do que tudo a questões económicas? Qual é o verdadeiro ponto de discórdia?

É claro que a questão surgiu por discórdias políticas. Antes, houve palavras de rivalidade. Em seguida, o massacre de Juba em 15 de Dezembro de 2013, com mais de 18 mil civis mortos da etnia Nuer, certamente se tornou uma questão tribal. Não devemos esquecer os inícios: na verdade, a imprensa tende a esquecer. Por exemplo, mesmo quando o governo tomou Leer no ano passado, Leer foi queimada completamente. Entre janeiro e abril, foram mortas mais de 400 pessoas e ninguém fala sobre isso. Depois falam do massacre que houve em Bentiu, mas esquecem que antes houve outros massacres. E, naturalmente, a lei da vingança, que certamente não é nem cristã nem boa, tem as suas consequências. Um governo de unidade nacional é o único que pode criar as condições para elaborar uma Constituição, preparar as eleições e envolver todas as outras tribos na discussão dos problemas do Sudão do Sul. Sem isto, o problema volta a ser apenas entre os Nuer e os Dinka ou entre os Dinka e os Nuer. E, naturalmente, sabemos muito bem que a filosofia Dinka é que os Dinka nasceram para governar ("Born to Run"). Ora, partindo deste pressuposto, creio que um tal governo não vai deixar aberturas para uma solução do problema.

O que poderia fazer entender melhor a situação de insegurança, de violência e dor que se vive no Sudão do Sul neste momento?

Certamente o que faz  sofrer mais é ver que uma geração de jovens é destruída, quer de um lado quer do outro, numa guerra fratricida que não tem razão de existir. Isto é o que mais faz doer o coração, sobretudo a nós que estamos lá presentes, para dar esperança, para ajudar as pessoas a viver em paz e para criar uma comunidade de irmãos e irmãs onde o amor pode unir as várias tribos. (BS)








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