Belo Horizonte (RV) - Na antiga tradição, candidato era aquele que se vestia
de branco, candidus, para se apresentar ao sufrágio de escolhas no contexto
da comunidade. Portanto, candidatar-se significava, antes de tudo, ter condição moral
e ousadia para assumir exercícios de representatividade. Ser cândido é zelar pela
conduta honesta e ilibada. A partir dessa compreensão, é possível concluir que os
eleitos precisam continuar candidatos, isto é, devem se empenhar, dia a dia, com incidência
em cada um dos seus atos, escolhas e deliberações, no compromisso de alicerçar-se
numa conduta merecedora de confiança.
O primeiro compromisso dos representantes
públicos deve ser assumir a condição de servidor do povo. Assim também deve ser nos
diferentes âmbitos e instâncias da sociedade, incluindo religiosas, corporativas,
educacionais e todas as outras que articulam a identidade pluralista da contemporaneidade.
Leves descuidos, seja na esfera pessoal ou social, provocam sérios prejuízos, alimentam
vícios que comprometem o desenvolvimento e impedem a inadiável construção de um mundo
mais justo e solidário. Se alguém se candidata, sua moralidade há de ser a base primeira,
antes mesmo da indispensável competência administrativa e técnica. Pode se imaginar
o desastre quando faltam parâmetros morais a um gestor. Obviamente, paga-se um preço
muito alto.
O candidato eleito não pode agir de modo superficial, pois sua
autoridade política deve ser instrumento de coordenação das relações, procedimentos,
funcionamentos e instituições para que estejam a serviço do desenvolvimento humano
integral. Nesta perspectiva, pois, não bastaria ao representante do povo apenas lutar
por algumas causas, nem mesmo somente trabalhar para garantir o desenvolvimento econômico,
em vista de uma organização social equilibrada. É imprescindível compreender e, consequentemente,
agir à luz e no horizonte do desenvolvimento integral. Aponta-se aqui que não será
exitosa uma representação, gerência ou condução na sociedade se prevalecerem as lacunas
humanísticas e o estreitamento de interesses cartoriais. Certamente, dessas lacunas
derivam as mediocridades que fragilizam a necessária ideologia político partidária,
que deveria contribuir para o debate e exercício da cidadania. Em vez disso, servem
de “trampolim” para ações egoístas, que beneficiam poucos e enfraquecem o gosto pelo
bem comum, especialmente pelos mais pobres. Os avanços sociais vividos no Brasil
das últimas décadas ainda não são suficientes para a equidade própria de uma cultura
civilizada. É bom lembrar que sem o espírito de candidato, comprometido com o desenvolvimento
integral, o prejuízo é previsível e torna-se permanente a carência de respostas. Continuam
os loteamentos e aparelhamento de máquinas públicas, uma sedução para quem, por falta
de lastro humanístico, se corrompe no poder e no dinheiro. Obviamente, não se alcança
a necessária conduta moral de “uma hora para a outra”. Só quem, ao longo da vida,
trilha esse caminho consegue reconhecer a centralidade que é o bem do outro e, sobretudo,
dos que são os pobres. Portanto, manter-se na condição de “candidato puro” é zelar
pela própria autoridade moral. Para isso, não basta apenas o respeito a normas e valores
de caráter puramente históricos e sociológicos. Torna-se imprescindível reconhecer
a dimensão de transcendência da ordem moral, universal e absoluta, de igual valor
para todos. Sem esse reconhecimento, a luta pelo poder levará à insanidade. A manipulação
interesseira é berço perene da corrupção. A incompetência humanística e relacional
alimenta uma sociedade incivilizada, que sofre com as arbitrariedades e usurpações.
A ordem moral não pode existir sem Deus. Separada dele, desintegra-se. E cada
candidato eleito, atuando no Estado laico, de modo a respeitar sua incontestável laicidade,
o enriquece com essa força. A ordem moral é base que permite buscar o bem de todos.
Por isso, não basta ao eleito dominar estratégias e compreender mecanismos de funcionamento
das instituições. Agora, terminadas as eleições, está dada aos eleitos a oportunidade
de evitar exercícios medíocres do compromisso assumido e da confiança conquistada.
Espera-se que cada representante tenha como ponto de partida uma visão articulada
do desenvolvimento em nosso tempo. Assumam sempre, como prioridade, o trabalho para
que os mais sacrificados da sociedade superem a fome, a miséria, as doenças endêmicas,
o analfabetismo de todo tipo, promovendo audaciosas reformas. Faço votos para que
os escolhidos continuem comprometidos com suas propostas e não esqueçam que devem
ser sempre candidatos, candidus. Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo
metropolitano de Belo Horizonte