Sínodo: os desafios pastorais da família no contexto da evangelização – uma síntese
dos trabalhos
O Sínodo
Extraodinário dos Bispos sobre os desafios pastorais da família no contexto da evangelização,
começou no domingo dia 5 de outubro com uma Solene Eucaristia na Basílica de S. Pedro.
Na sua homilia o Papa Francisco, referindo-se ao Sínodo, deixou claro o que deve ser
uma assembleia sinodal:
“As assembleias sinodais não servem para discutir ideias
bonitas e originais, nem para ver quem é mais inteligente… Servem para cultivar e
guardar melhor a vinha do Senhor, para cooperar no seu sonho, no seu projeto de amor
a respeito do seu povo. “
Na segunda-feira, dia 6 de outubro, no início da
primeira assembleia do Sínodo sobre a família, o Papa Francisco falou aos padres sinodais
e considerou ser este encontro uma grande responsabilidade que nos obriga a “falar
claro” “com frontalidade evangélica” e o “coração aberto”.
Por isso, peço-vos,
por favor, estas duas atitudes de irmãos no Senhor: falar com parresia – clareza e
coragem evangélicas – e escutar com humildade. Fazei-o com muita tranquilidade e paz,
porque o Sínodo decorre sempre cum Petro et sub Petro e a presença do Pai é
garantia para todos e custódia da fé. Caros irmãos, colaboremos todos para que se
afirme com clareza a dinâmica da sinodalidade.
Após a intervenção do Santo
Padre coube ao relator-geral do Sínodo, o Cardeal Peter Erdo, a missão de descrever
o panorama de início do Sínodo tendo como base o Instrumento de Trabalho apresentado.
E forneceu, desde logo, o método do trabalho sinodal:
“Devemos, pois, recordar
que a assembleia extraordinária de 2014 é a primeira etapa de um caminho eclesial
que desaguará na assembleia ordinária de 2015. Daí deriva que a linguagem e as indicações
devem ser tais que promovam o aprofundamento teológico mais nobre, para escutar com
a máxima atenção a mensagem do Senhor, encorajando, ao mesmo tempo, a participação
e a escuta da comunidade dos fieis” – disse o Cardeal.
Segundo o cardeal Erdo,
na família existem situações pastorais difíceis que são “uma verdadeira urgência pastoral”.
Logo na primeira congregação da assembleia sinodal houve dezenas de intervenções –
como afirmou o Padre Lombardi, Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, em conferência
de imprensa repetindo a exigência que muitos bispos fizeram acerca de uma renovação
da linguagem do anúncio do Evangelho:
“Diversas intervenções têm que ver com
a atenção à linguagem que a Igreja deve usar para responder e fazer-se entender. Um
outro grande núcleo, à volta do qual rodaram várias intervenções é aquele do respeito
da gradualidade: ou seja, o facto de que há um caminho, através do qual os crentes
cristãos se aproximam àquele que é o ideal da família cristã e do matrimónio cristão
na apresentação do Magistério da Igreja.”
O Padre Federico Lombardi, Diretor
da Sala de Imprensa da Santa Sé, no seu briefing diário partilhou com os jornalistas
uma imagem verbal que foi apresentada no terceiro dia de trabalhos:
“ Falou-se
da Luz que a Igreja traz ao mundo … não tanto como um farol mas como uma vela acesa,
uma tocha que acompanha o povo em caminho”
A fé não é aderir a conteúdos –
sublinhou o Padre Lombardi – mas uma adesão, um encontro com Cristo. “A crise
das famílias na Igreja e também a crise das famílias cristãs na sociedade está muito
ligada à crise geral da fé neste tempo. Foi notado como é preciso estar atentos em
recordar que a fé não é aderir só a conteúdos, a ensinamentos, mas a fé é, antes de
mais, uma adesão pessoal a Cristo, uma escolha por Cristo, um encontro com Cristo,
uma aliança com Ele.”
Duas linhas de reflexão emergiram dos debates acerca
dos divorciados recasados. Uma acentua a doutrina a outra a aproximação pastoral através
da misericórdia. Segundo o padre Lombardi foram mesmo apresentadas propostas concretas
de organização dos serviços diocesanos para tratar este assunto:
“Houve também
propostas bastante concretas de organização de gabinetes diocesanos que enfrentem
a temática sob a direção do bispo. Ao mesmo tempo, também sobre esta temática insiste-se
sobre a atenção às exigências da verdade e da justiça, para não chegar a uma espécie
de divórcio católico e, portanto, inserir e reconhecer a importância também do processo
e dos procedimentos canónicos, numa pastoral conjunta de verdadeira atenção ao bem
do povo de Deus e das pessoas.”
Dos testemunhos apresentados, destaque para
aquele que falou em português: o casal Artur e Ermelinda, unidos em matrimónio há
41 anos e coordenadores das Equipas de Nossa Senhora no Brasil. Este casal brasileiro
falou da sexualidade do casal afirmando que é preciso saber cultivar o desejo e até
mesmo um erotismo sadio. Segundo eles o controlo da natalidade através dos métodos
naturais teoricamente é bom; porém, na cultura atual parece a este casal carecer de
praticidade. O casal Artur e Ermelinda concluiu o seu testemunho considerando
que é importante responder “às exigências do mundo atual” sem “ferir o essencial da
moral católica”. Sobre os divorciados recasados, o padre Federico Lombardi, informou
os jornalistas sobre um modelo apresentado por um padre sinodal de novos percursos
de acolhimento. Intimamente ligado a este argumento está o aspeto sacramental ligado
à possibilidade de aproximação à Eucaristia. Sobre este ponto o padre Lombardi recordou
uma observação muito importante:
“É aquela que aconteceu com aquilo que tinha
feito S. Pio X no seu tempo admitindo as crianças à Eucaristia: tinha sido considerado
extremamente revolucionário, extremamente inovador no seu tempo. Portanto, existem
também exemplos de coragem da parte de um Papa – mesmo sendo uma situação muito diferente
daquela em que estamos – no refletir ou no introduzir novidades no que diz respeito
às condições de acesso à Eucaristia.”
A segunda semana do Sínodo sobre a família
começou com a “Relatio post disceptationem” – o Cardeal Peter Erdo, relator-geral
do Sínodo, apresentou em 58 pontos os principais contributos propostos nas reflexões
da primeira semana. Ideia principal a reter a necessidade de fazer escolhas pastorais
corajosas na ação da Igreja junto das famílias, nomeadamente naquelas onde aconteceram
separações ou mesmo divórcios. O documento desenvolve-se em três ideias-chave: escutar
o contexto socio-cultural em que vivem as famílias hoje; olhar para Cristo e para
o seu Evangelho da família e confrontar-se sobre as prospetivas pastorais a iniciar.
“
Torna-se necessário um discernimento espiritual, no que diz respeito às convivências,
aos matrimónios civis e aos divorciados recasados, compete à Igreja reconhecer aquelas
sementes do Verbo espalhadas para além dos seus confins visíveis e sacramentais. (...)
A Igreja dirige-se com respeito àqueles que participam na sua vida em modo incompleto
e imperfeito, apreciando mais os valores positivos que conservam do que os limites
e as faltas.”
“Evangelizar é responsabilidade partilhada por todo o povo de
Deus, cada uma segundo o próprio ministério e carisma. Sem o testemunho alegre dos
cônjuges e das famílias, o anúncio, mesmo que correto, arrisca-se a ser incompreendido
ou de se afogar no mar de palavras que caracteriza a nossa sociedade. As famílias
católicas são chamadas a ser elas próprias os sujeitos ativos de toda a pastoral familiar.”
Após
a primeira semana do Sínodo os trabalhos passaram para um ritmo de pequenos grupos,
os chamados “círculos menores” cujos relatórios foram apresentados na quinta-feira
dia 16 de outubro em Assembleia Geral com sugestões concretas relativas ao texto do
relatório após o debate. Uma das sugestões é a de ser dado maior realce à mensagem
positiva do Evangelho da família, sem olhar apenas para as preocupações das famílias
em crise. Outro ponto diz que é necessário dar maior atenção à presença de idosos
no interior dos núcleos familiares e às famílias que vivem em condições de extrema
pobreza. É também sublinhado o papel essencial das famílias na evangelização e na
transmissão da fé. Em relação à aproximação dos divorciados recasados ao sacramento
da Eucaristia foram expressos dois tipos de reflexão: de um lado quem sugere que
a doutrina não seja modificada, do outro lado quem sugere que se abra a possibilidade
de comunhão numa ótica de compaixão e misericórdia em determinadas condições. Os
“círculos menores” aconselharam ainda uma reflexão mais ampla sobre a figura de Maria
e da Sagrada Família, propondo-a melhor como modelo de referência para todos os núcleos
familiares. Entretanto, em conferência de imprensa o cardeal austríaco D. Christoph
Schönborn, arcebispo de Viena, salientou que o Sínodo dos Bispos sobre a família tem
procurado “acompanhar” a história das pessoas no momento atual, seguindo as indicações
do Papa Francisco:
“Penso que, para além de tantas questões morais, devemos
ver o papel positivo, fundamentalmente positivo da família. Penso que o Papa nos tenha
convidado a ver o tema da família não para ver tudo o que não funciona na família
(…) mas para mostrar antes de mais a beleza e a necessidade vital da família. Por
isso convidou-nos a ter um olhar atento à realidade.”
O cardeal Schönborn afirmou
que neste Sínodo havia dois ritmos: aqueles que dizem para termos atenção com a doutrina
e os que dizem: não tenhais medo:
“Se alguns padres do Sínodo dizem: “Atenção,
não podemos esquecer a doutrina”; do outro lado existe a necessidade do acompanhamento
de tantas situações das quais o Papa fala de hospital de campanha. Acontece muitas
vezes que numa família a mãe diga: ‘É demasiado perigoso’ e que o pai diga: ‘Não,
não tenhas medo’. Estamos numa grande família. Assim uns dizem: ‘Atenção! Têm razão,
é perigoso!’; e os outros dizem: ‘Não tenhais medo!’. “
O Sínodo dos Bispos
sobre a família tem encontro marcado para o próximo mês de outubro de 2015. Até lá
continuarão nas dioceses as reflexões, os aprofundamentos e a participação das famílias
e dos fiéis sobre os desafios pastorais da família no contexto da evangelização. (RS)