2014-08-30 12:18:18

Editorial: Nossos irmãos


Cidade do Vaticano (RV) - RealAudioMP3 Já se tornou tradicional iniciarmos sempre o Ano Novo com uma mensagem do Santo Padre, na qual ele nos chama a atenção para aspectos do nosso cotidiano e nos indica, nos dá pistas, para vivermos o ano que está nascendo com propósitos que vão além do nosso egoísmo pessoal: isto é, propósitos que envolvem somente a nossa pessoa e aqueles que nos rodeiam. As reflexões apresentadas pelos Sucessores de Pedro ao longo dessa iniciativa de início de ano, - que começou com Paulo VI em 1º de janeiro de 1968 -, inserem-se no amplo leque de temas que o Papa, e com ele a Igreja, deseja fazer com que as pessoas reflitam e se identifiquem com as realidades que muitas vezes passam despercebidas.
Com o nosso caminhar apressado, de cabeça baixa, com preocupações a mil, nos esquecemos de que fazemos parte de um mundo que vive ao nosso redor, onde se consumam alegrias, mas também tristezas, onde pessoas vivem no maior luxo, e outras de modo irreconhecível na miséria da sarjeta: tudo isso misturado com os conflitos, guerras, indiferenças, mortes, sofrimentos, desolações.
O Papa Francisco, através do Pontifício Conselho da Justiça e da Paz, divulgou nos dias passados, o tema da sua Mensagem para o 48º Dia Mundial da Paz, que iremos comemorar em 1º de janeiro de 2015. “Não mais escravos, mas irmãos”: somente o tema, já nos dá o tamanho da importância da reflexão que Francisco nos propõe e que, já hoje, nos leva a refletir de maneira mais ampla sobre um tema muitas vezes submerso na indiferença das nossas sociedades opulentas e ao mesmo tempo martirizadas pela extrema pobreza e violência. Sim porque, como diz o texto de apresentação do tema “julga-se habitualmente que a escravidão seja um fato do passado. No entanto, esta praga social continua muito presente no mundo atual”.
A presença dessa praga em nossos dias nos leva a pensar que a humanidade não evoluiu no seu “ser civilizado”, mas ao contrário, usa, essa “civilização” chamada moderna, para modernizar modos ainda mais terríveis e desumanos para escravizar o próximo, para cancelar a sua identidade de “ser humano”, de “filho de Deus”. Assim não seremos jamais todos irmãos com “igual dignidade”.
Estamos falando de um mundo onde o ser humano não é mais sujeito, mas objeto, onde tudo é permitido em busca daquele ter, possuir, daquela riqueza e poder que deve ser conquistado a todo custo, passando por cima de todos, da dignidade de quem se encontra no caminho. A escravidão nasce da negação do outro: o outro não existe como pessoa, é mercadoria a ser desfrutada. “A escravidão representa um golpe de morte para a fraternidade universal e, por conseguinte, para a paz. Na verdade, a paz existe quando o ser humano reconhece no outro um irmão ou irmã com a mesma dignidade”, diz o texto de apresentação do tema do Dia Mundial da Paz.
Vemos na sociedade atual que se inventa a cada dia novas maneiras de se aproveitar do outro produzindo formas abomináveis de escravidão. Basta abrirmos os jornais para identificarmos que o mundo moderno está doente, porque não cuida do seu bem mais precioso, a pessoa humana. Lemos com freqüência o número sempre crescente do tráfico de pessoas, do comércio de mulheres e crianças, da prostituição; do trabalho escravo – situação que ainda vivemos no Brasil - da mentalidade de subjugar o outro. Tudo em nome do poder, do dinheiro.
Temos uma ferida aberta que sangra na nossa sociedade moderna e para combatê-la – afirma o texto de apresentação do tema – “deve-se reconhecer acima de tudo a inviolável dignidade de cada pessoa”. Sim, reconhecer o outro, esse é o ponto de partida, reconhecer a sua dignidade, o seu valor. Para isso, é necessário o compromisso da informação, da educação, da cultura em favor de uma sociedade renovada e que dê ênfase à liberdade, à justiça e à paz. O Papa Francisco não se cansa de pedir respeito pelo irmão, respeito pela sua dignidade.
O tema do Dia Mundial da Paz de 2015, - que tem tudo a ver com o que está ocorrendo nos dias de hoje, em países onde a paz é uma utopia, precisamente pelo não respeito da dignidade do irmão -, nos dá a oportunidade para continuarmos a refletir junto com a Igreja no Brasil, sobre o tema da escravidão e tráfico de pessoas. No ano passado a CNBB escolheu como tema da Campanha da Fraternidade precisamente o tráfico de pessoas, “Fraternidade e Tráfico Humano” e o lema, “É para a liberdade que Cristo nos libertou”: mais um convite para nos convertermos e irmos ao encontro dos irmãos mais necessitados e sofredores. Francisco refaz este convite. (Silvonei José)







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