Porto Alegre (RV) - Durante o mês de setembro, somos convidados a nos dedicar
mais intensamente à leitura da Sagrada Escritura. Ela orienta a vida da comunidade
de fé. Ao longo dos séculos, forjou cultura, ajudou a consolidar conquistas e continua
norteando a vida em sociedade.
Quando refletimos a Sagrada Escritura, somos
surpreendidos pela narrativa. É que do primeiro ao último livro encontramos a descrição
de um Deus que deseja encontrar e ser encontrado por aquele ser criado a Sua imagem
e semelhança: o ser humano.
Faz-se necessário, antes de tudo, compreender o
que significa ler e estudar. Leitura é estudo; e estudo é trabalho. Trabalho do intelecto,
isto é, trabalho dedicado na expectativa de acolher a mensagem do texto. No trabalho
do estudo e da leitura é necessário persistência e insistência. Persistência e insistência
de quem se sente atingido por uma palavra que não lhe pertence, mas que lhe vem ao
encontro, podendo oferecer ao leitor atento trabalhador dedicado! indicações para
uma vida com mais consistência. Ao mesmo tempo, faz-se necessário compreender a
dimensão do encontro. O termo “encontro” é muito usado no cotidiano. De fato, nossa
vida é marcada por várias experiências de encontro: encontro de amigos, trabalhadores,
jovens, grupos de idosos, de família, de estudos, de lazer etc. Todas apontam para
uma realidade maior: o próprio desejo do ser humano de buscar, fomentar e cultivar
uma relação de mútua identificação que denominamos “amor”. Encontro é, pois, uma experiência
caracterizada pelo amor, que anela a mútua identificação.
A Sagrada Escritura
descreve situações de encontro. É Deus que vem ao encontro das pessoas, e elas buscam
encontrar-se com o Senhor.
A experiência do encontro é puro toque, puro golpe.
E, assim, acontece transformação. E uma pessoa que fez a experiência não é mais a
mesma. A experiência encontro significa transformação.
Na experiência, o outro
sempre é tocado e transformado. É encontro vital, profundo.
Desse modo, podemos
compreender porque os diversos encontros entre Deus e o ser humano, entre Jesus e
seus interlocutores, sempre levam a uma transformação das pessoas, que se percebem
atingidas por “quem ensina como quem tem autoridade” (cf. Lc 4, 32).
Na base
da fé cristã, está a experiência do encontro com a pessoa de Jesus Cristo, o Filho
amado do Pai enviado ao mundo; Ele transforma, reúne e introduz todo ser humano de
boa vontade numa vida nova. Isso constitui o núcleo da fé cristã. “Nesse âmbito, o
encontro com Cristo acontece e se consolida ‘segundo as Escrituras’” (1Cor 15,3.4).
A graça do encontro e seu cultivo às pessoas de boa vontade capazes de fazer o bem,
a exemplo de Jesus que passou por entre nós fazendo o bem (At 10,38).
Vivemos
uma realidade marcada por absurdos: violência brutal, mortes, drogadição, vulgarização
da individualidade e sua intimidade, perda de sentido da própria vida; a impossibilidade
da comunicação, apesar dos tantos e sofisticados meios de comunicação; o impor-se
da virtualidade que confunde. Tudo isso pode, porém, ser assumido como possibilidade
para anunciar um outro modo de ser-pessoa, não mais como sujeito de poder e projeção,
mas como a abertura obediente, aventureira, disponibilidade total e radical para o
outro que para nós tem nome: Jesus, Caminho, Verdade e Vida.
Dom Jaime Spengler Arcebispo
Metropolitano de Porto Alegre