2014-05-12 20:41:56

Papa encontra padres e seminaristas estudantes em Roma: a Igreja, o sacerdócio, as tentações e desafios dos consagrados


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Cidade do Vaticano (RV) - Uma ocasião extraordinária para falar de coração aberto sobre a Igreja, o sacerdócio, as tentações e os desafios dos consagrados. Foi o que ocorreu na manhã desta segunda-feira, na Sala Paulo VI, no Vaticano, com o encontro do Papa com alunos dos Colégios pontifícios e Institutos de Roma. O Santo Padre deteve-se longamente com seminaristas e sacerdotes, sem nenhum texto preparado. A saudação ao Pontífice foi feita pelo Cardeal Beniamino Stella.

Falar de coração para coração, livremente, como fazem um pai e um filho que se querem bem. Foi a dimensão vivida no encontro entre o Papa e os alunos dos Colégios pontifícios e Institutos de Roma.

Francisco dialogou com seminaristas e sacerdotes provenientes do mundo inteiro e dirigiu, em primeiro lugar, um pensamento especial de proximidade aos cristãos da Ucrânia e do Oriente Médio ressaltando que a Igreja sofre muito também hoje, em muitas partes do mundo, por causa das perseguições.

Em seguida, respondendo à primeira pergunta sobre a formação sacerdotal, o Papa chamou a atenção para o "perigo do academicismo" que acaba fazendo com que se volte de Roma para as dioceses mais como "doutores" do que como "presbíteros":

"E se alguém cai neste perigo do academicismo, volta para a diocese não o padre 'tal' ou 'qual', mas o 'doutor', não? E isso é perigoso. Existem quatro pilares na formação sacerdotal: e isso o disse várias vezes, talvez vocês tenham ouvido. Quatro pilares: a formação espiritual, a formação acadêmica, a formação comunitária e a formação apostólica."

Vem-se a Roma, observou, para a formação intelectual, mas não se pode entender um padre que não tenha uma vida comunitária, uma vida espiritual e apostólica. "O purismo acadêmico – advertiu – não faz bem." O Senhor, acrescentou Francisco, "chamou-os a serem sacerdotes, a serem presbíteros: essa é a regra fundamental:

"Se somente se vê a parte acadêmica há o perigo de cair nas ideologias, e isso faz adoecer. Adoece também a concepção de Igreja. Para compreender a Igreja é preciso entendê-la a partir do estudo, mas também da oração, da vida comunitária e da vida apostólica. Quando caímos numa ideologia, porque somos macrocéfalos, por exemplo, e seguimos por esse caminho, temos uma hermenêutica não cristã, uma hermenêutica da Igreja ideológica. E isso faz mal, essa é uma doença."

A hermenêutica da Igreja, reiterou, "deve ser a hermenêutica que a própria Igreja nos oferece, que a própria Igreja nos dá". É preciso entender "a Igreja com olhos de cristão". Do contrário, observou, "não se entende a Igreja, ou acaba sendo mal entendida".

Em seguida foi feita ao Papa uma pergunta sobre como o Seminário pode tornar-se uma comunidade de crescimento humano e espiritual. Uma vez, observou o Santo Padre, um bispo ancião da América Latina disse que "é muito melhor o pior seminário do que a ausência do seminário".

O Santo Padre ressaltou que "a vida do seminário, ou seja, a vida comunitária, é muito importante. É muito importante porque há partilha entre os irmãos". É verdade, constatou, que "existem problemas, existem lutas: lutas de poder, lutas de idéias, inclusive lutas veladas; e vêm os vícios capitais: a inveja, os ciúmes." "A vida comunitária – disse com ironia – não é o paraíso: ao menos, o purgatório." E recordou que um santo jesuíta "dizia que a maior penitência, para ele, era a vida comunitária":

"Mas creio que por isso temos que seguir adiante, na vida comunitária. Mas como? São quatro-cinco coisas que nos ajudam muito: jamais falar mal dos outros! Se tenho alguma coisa contra o outro ou que não concordo: devo dizer face a face! Mas nós, clérigos, temos a tentação de não falar cara a cara, de sermos por demais diplomáticos, aquela linguagem clerical, assim... Mas nos faz mal, nos mal!"

O Papa Bergoglio recordou que 22 anos atrás, assim que foi nomeado bispo, teve uma conversação muito forte com um secretário seu, um jovem sacerdote que recentemente havia sido ordenado. "Muito respeitoso, mas me disse poucas e boas". E depois, acrescentou o Papa, pensei: "Jamais me desfarei dele como secretário: este é um verdadeiro irmão!"

"Ao invés, aqueles que nos dizem coisas bonitas na frente e depois não tão bonitas por trás... Aquilo é importante, mas os mexericos são a peste de uma comunidade: é preciso falar face a face, sempre. E se você não tem a coragem de falar face a face, fale ao superior ou ao diretor... que ele o ajudará. Mas não se deve ir de quarto em quarto dos companheiros para falar mal dos outros! É costume dizer que os mexericos são coisa de mulher: mas são também nosso, de nós homens! Nós fofocamos muito! E isso destrói a comunidade."

Outra coisa, prosseguiu o Papa, "é ouvir, escutar as diferentes opiniões e discutir sobre elas", "buscando a verdade, buscando a unidade: isso ajuda a comunidade". Francisco recordou que seu diretor espiritual o exortara a rezar por uma pessoa de quem estava enraivecido. Rezar, "nada mais".

E ressaltou a importância da "oração comunitária". Asseguro a vocês, disse, "que se fizerem essas duas coisas, a comunidade seguirá adiante, se pode viver bem, se pode falar bem, se pode discutir bem juntos": "não falar mal dos outros e rezar por aqueles com os quais tenho problemas".

Em seguida, foi a vez de uma pergunta sobre o "discernimento, vigilância e disciplina pessoal" de um consagrado. O Papa disse que a vigilância é uma atitude cristã. É importante perguntar-se "o que que há no meu coração", porque "onde está o meu coração está o meu tesouro". O primeiro conselho, frisou, "quando o coração está atribulado", é o conselho dos monges russos: "Colocar-se sob o manto da Santa Mãe de Deus", confiar a própria pessoa a Nossa Senhora:

"Alguém de vocês poderá me dizer: 'Mas Padre, em nosso tempo de boa modernidade, da psiquiatria, da psicologia, nestes momentos de turbulência creio que seria melhor recorrer ao psiquiatra que me ajude...'. Não descarto isso, mas em primeiro lugar recorrer à Mãe: porque a um padre que se esquece da Mãe, e sobretudo nos momentos de turbulência, falta-lhe alguma coisa."

Este, disse, "é um padre órfão: esqueceu-se de sua mãe!" Vigiar, prosseguiu, "não é ir à sala de tortura", é "olhar o coração. Devemos ser donos de nosso coração". E renovou a exortação, válida para todos – padres e bispos –, a concluir o dia diante do tabernáculo, diante do Senhor.

Em seguida, o Papa quis voltar a falar sobre a Virgem Maria: "A relação com Nossa Senhora – frisou – ajuda-nos a ter uma bela relação com a Igreja: todas as duas são Mães" e "se não se tem uma boa relação com Nossa Senhora", então se é órfão no coração. E falou sobre um diálogo, ocorrido 30 anos atrás, com dois professores e catequistas que se vangloriavam de "ter superado a fase de Nossa Senhora" para crer em Jesus Cristo:

"Fiquei sentido, não entendi muito. Falamos um pouco sobre isso. Isso não é maturidade, não é maturidade! É feio esquecer a mãe... E, para dizer isso de outro modo: se você não quer Nossa Senhora como Mãe, é certo que a encontrará como sogra, hein? E isso não é bom."

Em seguida, o Santo Padre respondeu a uma pergunta sobre a liderança dos pastores. "Há um só caminho" para fazer isso, disse: "o serviço". E se não se coloca a servir, "cai a liderança":

"É verdade: quando não há o serviço, você não pode guiar um povo. O serviço do pastor... O pastor deve estar sempre à disposição de seu povo. O pastor deve ajudar o povo a crescer, a caminhar."

O pastor, disse ainda, "faz o seu povo crescer" e "caminha sempre com o seu povo". Depois, Francisco recorreu ao De Pastoribus de Santo Agostinho para denunciar dois pecados dos pastores. Os "pastores negociantes" e os pastores que acreditam ser superiores a seu povo, "os pastores príncipes".

O Pontífice reconheceu que é "tão difícil tolher a vaidade de um padre". O povo de Deus – disse – perdoa muitas coisas em um padre":

"Mas não perdoa se você é um pastor apegado ao dinheiro, se é um pastor vaidoso que não trata bem as pessoas: porque um vaidoso não trata bem as pessoas. Dinheiro, vaidade e orgulho: os três degraus que nos levam a todos os pecados. Mas o povo de Deus entende as nossas fraquezas, e as perdoa; mas essas duas, não as perdoa. Não perdoa em um pastor o apego ao dinheiro. E que não lhe trate bem, o povo de Deus não o perdoa."

Francisco revelou um pouco do seu dia a dia, marcado por oração e trabalho. O ideal, disse, é terminar o dia cansado em decorrência das coisas feitas. Em seguida, foi interpelado sobre a nova evangelização, utilizada pela primeira vez por São João Paulo II, e que se encontra fortemente presente na Conferência de Aparecida:

"Para mim a evangelização supõe sair de si mesmo; supõe a dimensão do transcendente: o transcendente na oração a Deus, na contemplação e o transcendente em relação aos irmãos, ao povo. Sair de, sair de! Para mim esse é como que o cerne da evangelização. Sair significa chegar a, isto é, proximidade. Se você não sai de si mesmo, jamais terá proximidade! Proximidade."

"Estar próximo das pessoas – retomou –, estar perto de todos", porque "não se pode evangelizar sem proximidade". Uma proximidade "cordial", "de amor, também proximidade física".

O Papa voltou a refletir sobre as homilias que, disse, são "chatas" se "não há proximidade". É justamente na homilia que "se mede a proximidade do pastor com o seu povo", observou.

Se alguém fala 20, 30 ou até mesmo 40 minutos na homilia, se você "fala de coisas abstratas, sobre verdades da fé, você não faz uma homilia, dá aula", e você "não se faz próximo das pessoas". As homilias – disse – não são "conferências", devem ser "outra coisa":

"Supõe oração, supõe estudo, supõe conhecer as pessoas às quais falará, supõe proximidade." Sobre a homilia, na evangelização, "temos que caminhar muito", porque "estamos atrasados", "calibrar bem as homilias para que o povo entenda".

E aconselhou aos futuros sacerdotes uma homilia breve e intensa, de 8-10 minutos, porque depois "a atenção vai embora".

A última pergunta concentrou-se sobre como seguir o modelo do Bom Pastor. O Papa disse que, em primeiro lugar, se deve rezar. Depois, fundamentalmente, está "a capacidade de encontrar-se", "a capacidade de ouvir, de escutar as outras pessoas", "a capacidade de buscar, juntos, o caminho":

"E significa também não assustar-se, não assustar-se com as coisas. O Bom Pastor não deve assustar-se. Talvez, dentro de si, tema, mas jamais se assusta. Sabe que o Senhor o ajuda. O encontro com as pessoas, razão pela qual você deve ter cuidado pastoral, o encontro com o seu bispo. O encontro com o bispo é importante. É também importante que o bispo se deixe encontrar."

Francisco aproveitou a ocasião para evidenciar a importância da amizade entre os sacerdotes. Esse é "um tesouro que se deve cultivar entre nós":

"Como é bela uma amizade sacerdotal, quando os padres, como dois, três, quatro irmãos, se conhecem, falam sobre seus problemas, suas alegrias, suas expectativas... amizade sacerdotal. Procurem isso, é importante. Ser amigos... amigos. Creio que isso ajude muito a viver a vida sacerdotal, a viver a vida espiritual, a vida apostólica, a vida comunitária e também a vida intelectual: a amizade sacerdotal."

"Desejo-lhes – concluiu o Papa – que sejam amigos daqueles os quais o Senhor colocou ao lado de vocês", "a amizade sacerdotal é uma força de perseverança, de alegria apostólica, de coragem, também de senso de humor." (RL)







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